A missão de Michelle Bolsonaro é dizer que o marido não é machista
Não se sabe muito sobre Michelle Bolsonaro, mas, sabe-se que ela tem forte influência sobre as decisões tomadas pelo presidente da República, Jair Bolsonaro (PL). Sabe-se, ainda, que a campanha bolsonarista vê Michele como um trunfo a ser usado, já que o postulante a reeleição é pouco quisto no eleitorado feminino. Michelle é jovem, tem 40 anos, e é a terceira esposa de Bolsonaro. Normalmente discreta, ela tem aparecido bastante, e é uma das principais responsáveis por costurar o discurso político que alaga o bolsonarismo atualmente: o de que esta eleição é uma luta do bem contra o mal.
A primeira-dama já está de olho na narrativa que será formalmente aplicada no período de campanha, ela anseia pela continuidade do marido no cargo, e como todos os outros bolsonarista de primeira ordem, fará de tudo para que este anseio se torne factível. Michelle esteve na maior parte do tempo agindo nos bastidores, com poucos holofotes. Parte dessa discrição se dá em face ao desejo de abafar o caso Fabrício Queiroz, que teria depositado cheques que somavam R$89 mil na conta de Michelle. E logicamente que a primeira-dama queria fazer tudo, menos explicar o porquê dos depósitos suspeitos, estes, seriam parte do esquema de rachadinha que Bolsonaro e seus filhos são acusados de praticar.
No lançamento oficial da candidatura de Bolsonaro à reeleição, a primeira-dama foi a única, além do presidente, a proferir discurso. Michelle usou do tempo para enaltecer o marido, e afirmar que ninguém lutou pelas mulheres como ele. Contudo, talvez contaminada pela ignorância do esposo, Michelle esqueceu que os recursos para combater a violência contra a mulher caíram ao menor patamar dos últimos quatro anos.
Contra Bolsonaro também pesam anos de comentários machistas e, alguns deles, criminosos. A ingerência de Bolsonaro sobre a pandemia também afetou em determinância o público feminino, já esta parcela foi a que mais perdeu empregos e que seguidamente observou o lastro da fome se acentuar. Dados oficiais dão conta que mais de 100 milhões de brasileiros apresentam algum nível de insegurança alimentar, isso corresponde a quase 50% da população brasileira.
É essencial ponderar, também, que o conservadorismo bolsonarista atinge em foco o campo feminino, que testemunha seus direitos reprodutivos e o próprio domínio sobre seu corpo serem caçados cotidianamente.
Dados do Superior Tribunal Eleitoral totalizam o eleitorado brasileiro em pouco mais de 156 milhões. Desse total, 53% são mulheres. E neste eleitorado, o atual morador do Palácio da Alvorada conta com 61% de rejeição. Em fronte a esses dados, a campanha usa a primeira-dama, ela entoa o discurso de igualdade entre os gêneros e tenta humanizar o marido, tirando dela um ideal machista que ele próprio consolidou.
Todavia, será mesmo possível desconstruir uma figura de ataque à mulher moldada em mais de 30 anos de vida pública? Essa é a tarefa de Michelle. Ela é percebida pela campanha como a mola de salvação de Bolsonaro nesta parte do eleitorado. Entretanto, a própria Michelle é alvo das ‘piadas’ do marido. Bolsonaro já disse que sua esposa acorda todo dia pedido R$ 5 mil, por exemplo. Já chamou a filha do casal de fraquejada.
A primeira-dama é influente, quanto a isso não se pode duvidar. Ela bancou a candidatura avulsa de Damares (Republicanos) ao senado pelo Distrito Federal. Foi a responsável pela continuidade do nome de André Mendonça como indicado aos Supremo Tribunal Federal, e disse não à presença de Carlos Bolsonaro na Esplanada. Porém, a influência de Michelle ainda não se mostrou capaz de ultrapassar os limites estabelecidos, e banhar o povo com sua opinião.
Michelle é refém do discurso de luta do bem contra o mal, narrativa que ela ajudou a desenhar. A primeira-dama tenta furar a bolha e falar à públicos não convertidos, no entanto, consolida impropérios que parecem ditos por seu marido. Em ato realizado em Belo Horizonte – MG, ela afirmou que o Alvorada estava no passado consagrado à demônios.
O fato é que Bolsonaro tem problemas para lidar, é fortemente rejeitado entre mulheres, jovens e negros. No eleitorado feminino tenta usar Michelle para mitigar a diferença para o ex-presidente Lula (PT), porém, o resultado tem vindo em passos lentos. Michelle está no mesmo molde de seu marido, conjuga a indiferença e banha-se em um ideário religioso velho e antiquado. Se ela quiser furar a bolha no eleitorado feminino real terá de despir-se de si mesma, algo que ela não parece disposta a fazer, pois seria assumir em alto som o fracasso abissal que graceja no governo Bolsonaro.
Na guerra das primeiras-damas parece que Michelle ficará para trás. Por falar em Michelle, alguém sabe dos R$89 mil depositados na conta dela?